Expedição a Marte, viagem sem volta
Imagem da estação que a Mars One planeja construir. EFE/Bryan Versteeg /Imagem cedida pela Mars One.
Marte
fascina o homem desde tempos imemoriáveis. A conquista do espaço foi um
dos grandes sonhos da humanidade nos tempos da Guerra Fria, mas os dias
das expedições à lua, os sputniks e as frases que ficaram para história
pareciam ter ficado pra trás desde que a Nasa (agência espacial
americana) começou a sofrer os estragos da crise financeira.
Porém,
nem tudo está perdido; pelo menos para a empresa holandesa Mars One,
que está preparando o primeiro assentamento humano no planeta vermelho. A
empresa criada pelo pesquisador Bas Lansdorp pretende vender os
direitos de exploração de um reallity show para financiar o projeto e
assim fazer com que a utopia possa se transformar em realidade.
Apesar
de ser um projeto que conta com a confiança do doutor Gérard't Hooft,
vencedor do Prêmio Nobel de Física em 1999, cientistas do Instituto
Nacional de Técnica Aroespacial (INTA), da Agência Espacial Europeia
(ESA) e do Observatório Astronômico de Almadén de la Plata, em Sevilha,
se mostram céticos.
Imagem de Marte feita pela sonda “Curiosity”. EFE/Nasa/Facilitadas pelo Instituto Nacional de Técnica Aeroespa …
MARTE HABITÁVEL EM 2022?"O
único motivo pelo qual esta expedição não aconteceu antes é a falta de
financiamento", explica a porta-voz da Mars One, Aashima Dogra. No
entanto, os cientistas encontram mais alguns obstáculos para esta
aventura.
Marte é o planeta de nosso sistema solar com condições
mais próximas às da Terra, mas mesmo assim um astronauta sem o traje
espacial "não duraria mais de 20 segundos sem perder a consciência e
morreria depois de um minuto", segundo o diretor do Observatório
Astronômico de Almadén de la Plata, Miguel Gilate.
Em suma,
trata-se de planeta com um ambiente hostil para a espécie humana: "A
vida em Marte só pode ser imaginada sob a superfície (como na lua) e com
excursões limitadas no tempo", garante o diretor científico da missão
Mars Express, da ESA, Agustín Chicarro.
As temperaturas são muito
mais baixas que as da Terra (-100 graus centígrados) e os astronautas
que aceitassem a missão teriam que suportar, além de uma baixíssima
pressão atmosférica, tempestades de vento de até 500 quilômetros por
hora e radiações ultravioleta de uma intensidade altíssima.
Por
este motivo, "não podemos imaginar seres iguais a nós em outros
planetas, já que as condições serão diferentes", esclarece Gilate.
No
entanto, "a Mars One esta pondo todo o conhecimento que se adquiriu ao
longo dos anos em uma só missão", indica a porta-voz da empresa, que
confia que, transformando de maneira artificial as condições do planeta,
os quatro astronautas selecionados para a viagem possam sobreviver.
"Todas
estas mudanças não são nem possíveis nem desejáveis (pela mudança
ambiental com consequências imprevisíveis que representariam estes
transtornos em outro planeta)", acrescenta Chicarro.
Imagem de uma das plantações que a Mars-One levaria a Marte. EFE/Bryan Versteeg/Imagem cedida pela Mars One.US$ 6 BILHÕES E UMA PASSAGEM SEM VOLTAApós
uma perigosa viagem de seis a setes meses em direção ao planeta
vermelho, quatro dos candidatos selecionados aterrissariam muito longe
do planeta que lhes viu nascer e jamais poderiam retornar.
Encontrar
astronautas que não enlouqueçam diante da ideia de não poder voltar é
uma tarefa árdua e difícil e levam Chicarro à conclusão que "ir a Marte
para não voltar é algo pouco pensado, uma maneira romântica de
suicidar-se".
O motivo dado pela empresa Mars One é que "não
existe a tecnologia necessária para trazê-los outra vez". "Existe para
poder fazê-lo em uma missão curta", mas a empresa quer criar a primeira
colônia humana além da estratosfera.
O custo da missão (US$ 6
bilhões) e o financiamento também surpreendeu os cientistas e, na
direção do Centro de Astrobiologia do INTA, Javier Gómez-Elvira lembra
que a Nasa tinha planejado missões a Marte para 2017.
"Em 2011
foi apresentado um projeto da Nasa, o Space Launch System, que propunha o
desenvolvimento de um novo lançador capaz de enviar uma tripulação a
Marte com um orçamento muito maior e que estaria pronto para 2017. Acho
que esse projeto não se iniciou por seu alto custo", contou
Gómez-Elvira.
Existe uma companhia privada Space X que apoia a Mars
One e que pensa que terá pronto um lançador para desenvolver o projeto,
mas o certo é que atualmente é extremamente custoso e "não parece que
esteja entre as prioridades das nações".
Imagem de Marte, o planeta vermelho. EFE/Nasa/Observatórios de Almadén.
QUERO SER ASTRONAUTAHá
menos de um mês a empresa abriu o processo de seleção para encontrar,
após pagamento prévio das despesas de inscrição que vão de US$ 5 a US$ 7
(dependendo do país de residência), os quatro primeiros astronautas.
Os
candidatos devem ser inteligentes, criativos, psicologicamente estáveis
e com boa forma física, além de estar preparados para solucionar
qualquer problema potencial, "alguns deles totalmente imprevisíveis",
segundo o site da empresa.
A capacidade de reflexão é a qualidade
essencial para os candidatos, embora também precisem ser curiosos, ter
"um espírito indomável", crescer perante as dificuldades e manter uma
atitude baseada no "posso fazer".
O processo de seleção, segundo
explica o site, terá um toque de show, pois a proposta é que duas de
suas quatro fases sejam transmitidas pela televisão ou pela internet, em
nível nacional ou inclusive mundial, até que restem seis grupos de
quatro pessoas que passarão anos treinando.
Já em 2022 e com
todos os candidatos devidamente formados, a grande decisão será tomada
de maneira "democrática", na qual "os moradores da Terra" poderão votar
sobre qual grupo dará o grande salto.
Os futuros aspirantes a
astronautas não perdem tempo e no site da Mars-One se amontoam as
solicitações - acompanhadas de um vídeo de apresentação - procedentes de
todos os cantos do mundo.
Realidade ou ficção? Será preciso esperar
dez anos para descobrir. Embora nenhum dos pesquisadores duvide que
algum dia o homem pisará em Marte: "A possibilidade de habitar a Lua ou
Marte não parecem impossíveis Quando será factível? Isso é talvez o que
não é possível imaginar", considera Chicarro.
Mas o afã
explorador dos humanos não deve nos confundir. “A Terra é o planeta mais
lindo e complexo que conhecemos" – garante o especialista - "e o certo
seria usar nosso tempo para cuidar dela da melhor maneira possível".
O deserto de Marte visto pelos robôs da Nasa. EFE/Nasa/Observatórios de Almadén.